A partir deste ano, o Sistema Único de Saúde (SUS) começará a substituir gradualmente o tradicional exame citopatológico, conhecido como papanicolau, pelo mais avançado exame molecular de DNA-HPV. Com essa mudança, o intervalo entre as coletas, quando o vírus não for diagnosticado, passará a ser de cinco anos. A faixa etária para o rastreamento, sem sintomas ou suspeita de infecção, continuará sendo entre 25 e 49 anos.
Essa alteração faz parte das novas diretrizes para o diagnóstico do câncer do colo do útero, apresentadas na quarta-feira (26) pelo Instituto Nacional do Câncer (Inca). O novo protocolo já foi aprovado pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS e pela Comissão de Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas (Conitec), aguardando apenas a avaliação final da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação do Ministério da Saúde para entrar em vigor.
O HPV (papilomavírus humano) é responsável por mais de 99% dos casos de câncer de colo do útero, que é o terceiro câncer mais comum entre mulheres brasileiras, com cerca de 17 mil novos casos anuais. Com as altas taxas de vacinação e exames preventivos, especialistas acreditam que essa doença pode ser erradicada nos próximos 20 anos.
O teste molecular de DNA-HPV é considerado o exame primário para detecção do HPV pela Organização Mundial da Saúde desde 2021, por ser mais eficaz na redução dos casos e óbitos, devido à sua maior sensibilidade. Ele também permite identificar o subtipo do vírus, o que é crucial, pois apenas algumas variantes têm risco de causar lesões que podem evoluir para câncer.
Itamar Bento, pesquisador da Divisão de Detecção Precoce do Inca, explica que essa maior sensibilidade do exame possibilita aumentar o intervalo entre as coletas. “O teste de DNA-HPV tem um forte valor preditivo negativo, ou seja, se o resultado for negativo, podemos confiar nesse resultado e aguardar cinco anos até o próximo exame”, afirma.
Além disso, o novo teste será implementado juntamente com o rastreamento organizado, onde o sistema de saúde busca ativamente as pessoas, ao invés de esperar que elas procurem as unidades de saúde. Isso exige uma convocação ativa e individualizada da população-alvo e garante acesso à confirmação do diagnóstico e tratamento adequado das lesões, quando necessário.
Entre 2021 e 2023, apenas três estados alcançaram cerca de 50% de cobertura do público-alvo com o papanicolau. Em outros estados, a porcentagem foi inferior, e algumas regiões não apresentam dados completos. Além disso, houve casos em que os resultados demoraram mais de 30 dias para serem entregues, dificultando o início do tratamento dentro do prazo legal de 60 dias.
O rastreamento organizado seguirá uma abordagem estruturada. Se o teste de DNA-HPV for negativo, o exame será repetido após cinco anos. Caso o exame detecte tipos oncogênicos, como os tipos 16 e 18, responsáveis por 70% das lesões precursoras de câncer, a paciente será encaminhada diretamente para colposcopia. Se for identificado algum problema na colposcopia, serão seguidas condutas específicas para tratamento.
As novas diretrizes também incluem duas inovações importantes: a possibilidade de autocoleta do material, especialmente para populações de difícil acesso ou resistentes ao exame tradicional, e orientações específicas para o atendimento de pessoas transgênero, não binárias e intersexuais.
Com essas mudanças, o Brasil busca melhorar a prevenção e o diagnóstico precoce do câncer de colo do útero, utilizando tecnologias mais eficazes e inclusivas para garantir acesso universal à saúde.