A judicialização tem sido cada vez mais utilizada como alternativa para acesso a medicamentos e procedimentos médicos no Brasil, tanto para tecnologias não incorporadas ao SUS quanto para aquelas que já fazem parte do sistema, mas enfrentam barreiras de distribuição.
Segundo dados do CNJ, o número de ações judiciais relacionadas à saúde pública aumentou 16% de 2022 para 2023, passando de 295.920 para 344.212 novos processos. Em 2024, o volume já superou os dois anos anteriores, com 345.666 ações registradas até novembro. O Ministério da Saúde desembolsou mais de R$ 1,6 bilhão até outubro para atender a demandas judiciais.
Uma das razões desse crescimento é a demora na disponibilização de tecnologias já incorporadas ao SUS. Um levantamento apontou que 76 medicamentos e procedimentos acumulam, em média, 648 dias para serem ofertados, ultrapassando em mais de três vezes o prazo previsto em lei.
A pedagoga Dayene Andressa Xavier Viana dos Santos, diagnosticada com leucemia mieloide crônica, enfrentou dificuldades para realizar o exame BCR-ABL, essencial para monitorar sua doença, mesmo sendo um procedimento oferecido pelo SUS. Após se mudar para Cuiabá, ela precisou recorrer à Justiça para garantir o direito ao exame, mas ainda enfrenta problemas de acesso.
Casos como o de Kelvin Moreira, diagnosticado com linfoma de Hodgkin, exemplificam o impacto da judicialização. Kelvin morreu em 2023, após esperar sete meses pela entrega de um medicamento, mesmo com decisão judicial favorável. O atraso resultou de impasses administrativos entre governos federal e estadual.
Especialistas apontam que uma gestão mais eficiente do SUS e maior transparência nos processos de incorporação de medicamentos poderiam reduzir a judicialização. “A morosidade e a falta de informações claras muitas vezes levam o paciente a buscar a Justiça para garantir seus direitos”, afirma Raul Canal, presidente da Anadem.
Além de impactar os desfechos clínicos, a demora no acesso a tratamentos afeta o bem-estar emocional de pacientes e profissionais de saúde, como destaca Fábio Fedozzi, diretor da Abrale: “A falta de acesso pode reduzir as chances de cura e causar grande sofrimento emocional, especialmente quando o paciente sabe que há tratamentos disponíveis.”